Posted por em 14 ago 2012

Mariposa 1Há uma parábola chamada “O Fariseu e o Publicano” (Lc 18:9-14) em que ambos os personagens se propõem a elevar seus pensamentos aos céus para orar. Apesar de a intenção ser idêntica, falar com Deus, as formas como se apresentam são inteiramente diferentes. Essa parábola, como acredito pretendia o próprio Cristo, remete-nos a muitas reflexões interessantes e importantes a respeito de como nos colocamos perante o Pai.

Tentarei fazer um exercício a respeito do tema com a intenção de promover uma autorreflexão em todos nós.

Estamos sempre a buscar o conhecimento intelectual, o que de certo é importante por proporcionar oportunidades de ver a vida sob pontos de vista mais amplos, como também oferecer novas alternativas nesse caminhar e evoluir. Abre novos horizontes, disponibiliza novas perspectivas.

Aprender mais, evoluir intelectualmente é determinante de uma vida melhor, mais consciente, mais salutar.

Essa é uma verdade irrefutável.

No entanto, percebemos muitas vezes que o conhecimento intelectual, por si só, não proporciona essa percepção mais rica sobre a vida. É um simples colecionar de aprendizados teóricos, mesmo que adquiridos a partir da prática científica. É como formarmos uma biblioteca em nosso cérebro, onde as informações são catalogadas para que sejam recuperadas e utilizadas para alguma finalidade imediata, sem a percepção de que estamos aqui para algo além de uma simples jornada terrena.

Essas informações, muitas vezes, se aplicam tão somente a nos oferecer uma vida mais confortável, com mais bem estar material, mas não nos remetem a como poderão ser úteis para o verdadeiro Ser que existe em nós – o Ser Espiritual.

Quando temos essa visão tão estreita sobre a vida, a conquista de vasto conhecimento se presta nos deixar mais envaidecidos e orgulhosos, a acreditar que somos melhores do que outras pessoas.

Esse é o caso do personagem Fariseu da Parábola. Ele conhecia todos os textos das Escrituras Sagradas e cumpria os ritos e exigências da Lei, até mais do que isso, como ele próprio afirmava no Templo, ao se colocar para falar com Deus. Sua visão puramente intelectual é que o fazia se perceber um ser especial, acima de todas as outras pessoas.

Apesar de conhecer a Lei e os Profetas, não percebia que o texto da Lei é frio e estéril se não acompanhado do entendimento que ele deverá proporcionar, impulsionando-nos à elevação moral e espiritual.

Ele se apresenta de forma arrogante e em sua apresentação ao Pai não apresenta nem louvor, nem gratidão, como também não pede coisa alguma. Só expressa em alta voz aquilo de que se orgulha: deter o conhecimento, cumprir os ritos religiosos, ser correto no proceder, e ainda desqualifica o Publicano que está ao seu lado no Templo.

Na realidade, o entendimento da essência dos ensinamentos contidos nos textos sagrados é que deverá ser perseguido por todos nós para que tenhamos um novo olhar sobre nós mesmos, sobre as pessoas com quem convivemos, sobre a Humanidade de uma forma geral. Enfim, sobre a vida com todas as suas variáveis e circunstâncias.

O personagem Fariseu, na parábola em questão, remete-nos a parte de nós mesmos quando nos colocamos em posição de destaque, subestimando os demais; quando nos vangloriamos do que temos e conquistamos ao longo da vida. Uma visão de nós mesmos pelo que expressamos exteriormente em palavras, ações e bens.

Com relação ao Publicano há também reflexões a serem feitas.

Um personagem que se apresenta como alguém que cumpre com suas obrigações (no caso coletor de impostos para o Império Romano), mas que percebe não agir de forma correta para com o seu próprio povo. Mostra-se arrependido e com intenção de promover mudanças em sua vida. Coloca-se de forma humilde ao buscar falar com Deus no Templo. Nem sequer se dispõe a levantar a cabeça durante a sua oração. Além do mais bate no peito para expressar seu arrependimento e pede perdão por seus erros.

O texto da Parábola começa assim:

“Dois homens subiram ao templo para orar; um fariseu, e o outro publicano.” (Lc 18:10)

A intenção dos dois personagens era a de orar ao Pai.

Refletindo sobre a forma como se colocaram perante o Pai, poderíamos perguntar: qual deles efetivamente se apresentou para orar?

Disse-nos Jesus:

“E, quando orardes, não sejais como os hipócritas; pois gostam de orar em pé nas sinagogas, e às esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo que já receberam a sua recompensa.

Mas tu, quando orares, entra no teu quarto e, fechando a porta, ora a teu Pai que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.” (Mt 6: 5-6)

Assim, creio que podemos afirmar que o Fariseu não esteve a orar, mas simplesmente se vangloriava das virtudes de que acreditava ser portador.

No entanto, o Publicano de fato recolheu-se ao íntimo do seu coração e expressou ao Pai sua intenção em buscar sua reforma íntima, sua reformulação moral e espiritual. Ele demonstrou envergonhar-se de suas atitudes e pediu perdão: “… ó Deus, sê propício a mim, o pecador!” (Lc 18:13).

A expressão “sê propício a mim” tem um significado especial na linguagem do Evangelho: pedir perdão a Deus pelos pecados, com a intenção de restaurar sua comunhão com Ele.

Também em nós há um Publicano a orar. Somos parte Fariseu e parte Publicano.

A busca pela nossa reforma íntima proporciona a oportunidade de refletirmos mais sobre qual dessas partes está se destacando mais no nosso proceder no dia a dia. Praticando o autoconhecimento temos melhores condições de manter o que há de melhor das duas partes: buscar o aprendizado, compreender a essência dos ensinamentos e praticá-los, colocarmo-nos humildemente no reconhecimento das nossas fragilidades e defeitos e prosseguir a nossa jornada em direção à nossa evolução intelectual e espiritual.

Texto do livro “Reflexões Evangélicas II”, de Elda Evelina Vieira, publicado através da Editora Bookess – http://www.bookess.com/read/11777-reflexoes-evangelicas-ii/

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