Posted por em 19 abr 2016

Cocar sagrado

Certa vez, há muitos anos, a passeio por Manaus, ouvi de uma pessoa da região a observação de não terem simpatia com a referência a serem considerados descendentes de “índios”, pois esta denominação fora dada aos habitantes das terras encontradas pelos colonizadores, quando do descobrimento, por acreditarem terem chegado às Índias. Essas terras – hoje as Américas do Norte, Central e do Sul – chegaram a ter o nome de Índias Ocidentais.

Considerava, aquela pessoa, que deveriam ser chamados de nativos, simplesmente assim.

A partir de então fiquei refletindo a respeito.

Em pesquisa encontrei mais um motivo para a inadequação da referência Índio pois, não obstante habitarem as Américas várias nações desses nativos, havia uma só denominação, como se fossem um só povo ou talvez, o que é mais provável, porque os colonizadores desconsiderassem esses povos a ponto de fazerem uma referência puramente genérica, sem que merecessem uma identificação mais precisa e respeitosa.

Por vezes tenho ouvido, até mesmo por pessoas consideradas intelectualizadas e até espiritualizadas, a referência a esses povos como seres primitivos, sem cultura, sem fundamentos éticos e percepções espirituais.

Quando tenho oportunidade para falar o que sinto a respeito, afirmo que esses povos já traziam profundas percepções das relações espirituais, acreditavam na comunicação com seus ancestrais e muitas vezes, através dessas comunicações intermediadas pelos Pajés ou Xamãs, conheceram mecanismos para lidar com várias doenças, utilizando a Natureza tão rica de espécimes, do reino vegetal ou animal, que continham em si recursos para tratamentos e até mesmo curas.

Tinham sua própria linguagem articulada, suas composições musicais, danças, rituais a que podemos chamar de religiosos, já que me foge no momento uma denominação mais adequada.

Sentimento profundo de solidariedade e de vida em comunidade, ainda que consideremos hoje terem sido de forma localizada e restrita… Vale aqui ressaltar que estamos falando de uma época em que eles precisavam constantemente defender seus territórios por serem nações independentes e, muito provável, de origens diversas, se considerarmos que vários povos já teriam passado pelas Américas antes dos espanhóis e portugueses.

Creio que alguns neste momento, ao lerem este texto, retruquem: – Se lutavam entre si podem ser considerados selvagens! Retorno eu a essas pessoas: – Então selvagens também somos nós, pois que ainda brigamos para defender “nossos” territórios, sejam nossas casas, nossos Estados, nosso País. Quantas guerras ainda são deflagradas a título de preservar a cultura, a religião, as raças etc.?!

Bem, voltando ao assunto anterior. Precisamos sempre, ao fazermos considerações a respeito de conceitos, culturas, costumes, contextualizar os fatos. Caso contrário, estaremos correndo sérios riscos de cometermos graves erros de avaliação, injustiças

Vale contemplar aqui todos aqueles que já viviam no Planeta, desde a antiguidade, época anterior à chegada dos considerados, por muitos de nós, mais intelectualizados. Aqueles nativos já tinham o sentimento de religiosidade, reconheciam nas forças naturais a presença de Deus e de outros Seres que tinham a função de manter o equilíbrio da Natureza.

Ah! Por falar em Natureza, devemos ressaltar que esses povos buscam manter convivência pacífica e respeitosa com as riquezas naturais – vegetação, rios, mares, animais. O uso desses bens de forma a não ter abuso ou desperdício. As nascentes mantidas, preservadas e respeitadas. Dos rios, só o estritamente necessário à sua sobrevivência.

Relações familiares mais fraternas do que de muitas famílias que podemos observar hoje em dia.

Bem, não vou me alongar muito mais, creio que já deu para ter uma noção do que estou querendo levar à reflexão de muitos e espero ter conseguido sensibilizar alguns, pois sei que muitos não o serão, até mesmo irão tecer críticas ao que aqui exponho.

Não importa, se conseguir sensibilizar pelo menos uma só pessoa, já estarei satisfeita, pois ela poderá ser uma multiplicadora das reflexões que aqui ofereço neste momento.


“Não precisamos de formas complexas, nem expressões exuberantes para transmitir o que vai na nossa Alma.
A Alma se mostra de forma singela e meiga quando expressa sentimentos verdadeiros.
Éassim que ela sensibiliza outros corações ao refletir a si própria como fonte de simples beleza e emoção.

Do livro Textos em Contextos, Elda Evelina, Bookess Editora

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